Isso foi escrito em março de 200
Mana ,
Eu pensei muito se
escreveria para você ... de repente poderia parecer que eu sou um espécie de
puxa saco ou até não sei o quê ... o fato é que foda-se o que as pessoas pensam
não é mesmo? Ficar levantando sua bola parece pouco pelo nível de mulher diva
power que você é. Confesso que você é a dramaturga que mais tenho proximidade,
apesar de ser um ótimo exercício pesquisar sobre outras. Mas antes mesmo de
tecer elogios e dizer que você é uma grande inspiração e guardiã eu tenho que
me desculpar por várias coisas. Uma delas é o fato de não ter tido competência
para apresentar o texto da Piscina com a investigação que ele demandava. Quando
nos conhecemos foi um suporte gigante para meu momento de renascimento. Você
chegou naquele café já como a entidade que é. Me acolheu com os olhos mais
atentos, escutou meu melodrama sem julgamentos, gargalhou no seu Exu me
trazendo a esperança perdida, os cacos foram colados com super bonder no mesmo
dia e comecei a perceber nocvas formas. Algumas horas depois você me envia o
texto cheio de bolinhas no teto, sapos, mangueiras, inundações, cartões de
visita, salto alto sem salto. Ahhh o escafandrista dourado... Era síntese, mas era
partida também. A mostra começou na Cia. Do Pássaro e as palavras emboladas na boca eram como
oração, começavam estranhas e lentas e eu já nem sei pra onde eu ia. Confesso
que era difícil submergir daquele mergulho de fato, você me visitou em sentidos
em poucos flashes, enquanto isso minha vida estava 36 degraus abaixo
literalmente, naquele apartamento as estruturas eram frágeis demais para
avançar sem recuar, mesmo nômades ou viciados era preciso dar conta da pedra no
caminho. E o PSCI in À ficou suspensa até hoje. Ás vezes em nossos encontros
tenho vergonha de falar do meu fracasso naquele momento, assim nunca mais
conversamos sobre o trabalho. No entanto, tantas coisas aconteceram, você
explodiu eu me recolhi como era preciso. E quando retornei à São Paulo encontrei a dramaturga
referência, super agendada, imersa no engajamento das lutas. Em um ano e meio,
o alcance da Dione era meteórico. Foi um orgulho tão grande! Apesar da vergonha
ainda escondida, consegui driblar minha covardia porque já era outros tempos.
Tempos que passaram muito rápido pra você eu imagino. Alguns encontros
marcantes depois, assim como o dia que você conheceu o Mia Couto e eu conheci
a Dione adolescente com os olhos
brilhantes e o coração na boca. Foi o dia que fomos cuidadas pela Didi. Depois
disso, o encontro atravessando a Brigadeiro Luis Antônio.
Dione vou publicar um livro e você vai
escrever o prefácio.
Ei-lo ai e eu aqui nessa
nave mãe, a Escola Livre que tanto me educou durante 4 anos. Me mostrou que
mestres e aprendizes são diferentes de alunos e professores, me ensinou formas
de resistir, me ensinou o valor da criação coletiva. Aqui foram os anos
dourados. Quem sabe esse retorno será anos dia amantes ?
E pra que tô nessa
nostalgia toda?
Porque eu tô tentando
entender a dramaturgia. Pessoas já são dramaturgias potentes e quando olho pra
sua trajetória eu sou capaz de aprender mais pela presença, porque vejo além da
obra. Eu realmente, não sei onde separa
essas coisas.
Pode soar algo tão
egoísta orbitar no próprio umbigo. Mas é de onde costumo colocar minha luneta
para enxergar o mundo. E nem sempre esse canto escuro e confortável é o melhor
ângulo, você sabe ... Tô tentando me despregar dessa casca e sinto que nessa
jornada você é Shiva apontando vários caminhos. Reconheço sua escrita nos poros
e isso me alimenta ainda mais.
Essa fricção de corpos...
acho que o caminho é por ai. (suspiro)
Essa carta não termina
aqui. Só vou botar um ponto sem final, por enquanto. Tô na pausa sem drama mas
em ação.
Fiquei pensando na
Piscina sem água.
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